“Criar animal silvestre é crime! O mais importante é saber que o animal silvestre não é feito para ser pet. Esses animais têm hábitos totalmente diferentes dos nossos e de outros animais domésticos e isso tem que ser respeitado.”
O apelo acima foi dito com bastante veemência por Erika Sayuri Kaihara, bióloga e gestora do Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de Barueri, criado pela Prefeitura e administrado pela Secretaria de Recursos Naturais e Meio Ambiente (Sema). Com apenas seis anos de existência, o local já se tornou referência em toda região pela atuação em defesa da vida silvestre.
O trabalho e a infraestrutura chamaram a atenção, por exemplo, do analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ivan Paulo Ortiz Pereira. “O Cetas Barueri é extremamente organizado, você nota uma eficiência muito grande, tanto da administração pública quanto da equipe que atua nele. É uma estrutura que poucas vezes a gente vê, um modelo a ser seguido em outras prefeituras e outros municípios do Brasil”, disse.
Espécies salvas, natureza mais rica
Só neste ano, o Cetas já recebeu mais de 800 animais e realizou a reabilitação e a soltura de 325 deles. Desde que foi criado, em agosto de 2012, quase 6 mil animais já passaram por lá – e isso significa receber todo os cuidados: triagem, avaliação clínico-geral com dois veterinários, medicação, prevenção, quarentena, reabilitação e soltura.
A maior parte das espécies que chegam vem de apreensões realizadas pela polícia, mas há também resgates, só que o Centro aceita apenas animais feridos e em situação de risco. Erika conta que, por lei, o órgão não pode fazer o recolhimento de filhotes e animais soltos, em vida livre, mesmo que estejam no quintal de alguém, a não ser que ofereçam perigo a outros ou a si mesmos.
A maior porcentagem das apreensões é no município, mas elas podem vir de todo o estado, geralmente da região metropolitana, grande foco das polícias ambientais, mas acontece de receber de outros estados também quando há demanda e as condições necessárias. A capacidade é para acolher até 3 mil animais por ano, mas isso depende de diferentes fatores (disponibilidade de tratadores e recursos para alimentação, medicamentos e laboratório).
Combater o tráfico
Cerca de 80% das espécies apreendidas são aves, mas tem de tudo um pouco pelo Cetas: lagartos, tartarugas, cobras, macacos etc. Até pinguim já foi parar por lá. Animais em risco de extinção também chegam aos montes. É o caso de azulões, papagaios e araras. Combater o tráfico de animais é um importante passo para a preservação da vida selvagem, mas não é fácil, conforme explica a bióloga.
“A gente tem que acabar com isso que chamamos de ‘cultura de prender animal’, é um hábito ruim que muita gente tem. Hoje em dia, felizmente, muitos já deixaram de fazer isso, mas em compensação comércio ilegal ainda é muito rentável, é o terceiro maior tráfico do mundo, só perde para o de armas e o de drogas. Se não tiver quem compre, seja para competição, seja para ter em casa, não vai ter quem venda, é o princípio básico de todo tráfico”, argumenta Erika.
Para ter um maior controle depois de todo o cuidado dispensado aos bichos, todos voltam à natureza anilhados (no caso das aves) ou microchipados (no caso dos mamíferos e répteis), assim podem ser rastreados caso encontrados em situação desfavorável. Biólogos, veterinários e tratadores compõem a equipe do Centro, que, incansável, se reveza para que em nenhum dia ou horário os animais fiquem desassistidos. “Tem que amar bicho, tem que gostar muito, mas não necessariamente gostar do bicho, mas do que faz, respeitar os animais e saber quais as necessidades deles, e que não estão aqui porque querem”, ensina Erika.
Atualmente o Cetas conta com 30 recintos que abrigam as espécies e cinco salas de quarentenário. Sua capacidade de atendimento deve dobrar em breve, já que está passando por uma ampliação que inclui mais 11 salas dessas, só que ainda maiores que as existentes. O local não é aberto à visitação.
Ao encontrar animais feridos ou oferecendo riscos, ou para denúncias de comércio ilegal ou maus-tratos de animais silvestres, entre em contato com a Guarda Ambiental Municipal pelo número 153.