Após declarações de Bolsonaro Cuba deixa programa Mais Médicos

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O Ministério de Saúde Pública do governo cubano anunciou nesta quarta-feira a decisão de retirar os médicos cubanos que estão no Brasil em atuação no Programa Mais Médicos. A decisão foi publicada no jornal Granma, veículo oficial do Partido Comunista de Cuba. “O Ministério da Saúde Pública de Cuba tomou a decisão de não continuar participando do programa Mais Médicos e assim foi comunicado ao diretor da Organização Pan-Americana da Saúde [Opas] e aos líderes políticos brasileiros que fundaram e defenderam essa iniciativa”, diz o texto.

De acordo com o governo cubano, a decisão foi tomada em função de declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), desqualificando profissionais cubanos. “O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, com referências diretas, depreciativas e ameaçando a presença de nossos médicos, disse e reiterou que vai modificar os termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito para a Organização Pan-Americana da Saúde e o que foi acordado por ela com Cuba, ao questionar a preparação de nossos médicos [cubanos] e condicionar sua permanência no programa à revalidação do título e como única forma a contratação individual”, afirma trecho da manifestação do ministério de saúde cubano.

A representação da Opas no Brasil, ligada à Organização Mundial de Saúde, confirmou que comunicou ao Ministério da Saúde do Brasil a decisão de Cuba. O Ministério da Saúde vai divulgar nesta quarta-feira um comunicado oficial sobre a decisão do governo cubano.

Por meio do Twitter, o presidente eleito afirmou que o país caribenho “não aceitou” condições colocadas por sua equipe para dar continuidade do programa. “Condicionamos à continuidade do programa Mais Médicos a aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje maior parte destinados à ditadura, e a liberdade para trazerem suas famílias. Infelizmente, Cuba não aceitou.”

Em um segundo tuíte, Bolsonaro acusou Cuba de “irresponsabilidade”. Segundo ele, o país caribenho não levou em consideração os impactos da decisão “na saúde dos brasileiros e na integridade dos cubanos”. Ele não explicou qual seria o risco à integridade dos profissionais.

Eis o tuíte: “Além de explorar seus cidadãos ao não pagar integralmente os salários dos profissionais, a ditadura cubana demonstra grande irresponsabilidade ao desconsiderar os impactos negativos na vida e na saúde dos brasileiros e na integridade dos cubanos.”

O programa

O programa Mais Médicos foi iniciado em 2013, no governo de Dilma Rousseff (PT). De acordo com o governo cubano, em cinco anos de trabalho, 20 mil profissionais cubanos atenderam 113,3 milhões de pacientes brasileiros que utilizam o Sistema Único de Saúde (SUS). Devido ao programa, pela primeira vez 700 municípios do país contaram com um médico no serviço público.

Em 27 de setembro de 2016, o governo cubano decidiu dar continuidade ao programa, após o impeachment de Dilma Rousseff, “desde que fossem mantidas as garantias oferecidas pelas autoridades locais”. Os termos do acordo, reconhece Cuba, foram respeitados até o momento.

Confira abaixo o teor do documento:

O Ministério da Saúde Pública da República de Cuba, comprometido com os princípios solidários e humanistas que durante 55 anos têm guiado a cooperação médica cubana, participa desde seus começos, em agosto de 2013, no Programa Mais Médicos para o Brasil. A iniciativa de Dilma Rousseff, nessa altura presidenta da República Federativa do Brasil, tinha o nobre propósito de garantir a atenção médica à maior quantidade da população brasileira, em correspondência com o princípio de cobertura sanitária universal promovido pela Organização Mundial da Saúde.

Este programa previu a presença de médicos brasileiros e estrangeiros para trabalhar em zonas pobres e longínquas desse país.

A participação cubana nele é levada a cabo por intermédio da Organização Pan-americana da Saúde e se tem caracterizado por ocupar vagas não cobertas por médicos brasileiros nem de outras nacionalidades.

Nestes cinco anos de trabalho, perto de 20 mil colaboradores cubanos ofereceram atenção médica a 113 milhões 359 mil pacientes, em mais de 3 mil 600 municípios, conseguindo atender eles um universo de até 60 milhões de brasileiros na altura em que constituíam 88 % de todos os médicos participantes no programa. Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história.

O trabalho dos médicos cubanos em lugares de pobreza extrema, em favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador de Baía, nos 34 Distritos Especiais Indígenas, sobretudo na Amazônia, foi amplamente reconhecida pelos governos federal, estaduais e municipais desse país e por sua população, que lhe outorgou 95% de aceitação, segundo o estudo encarregado pelo Ministério da Saúde do Brasil à Universidade Federal de Minas Gerais.

Em 27 de setembro de 2016 o Ministério da Saúde Pública, em declaração oficial, informou próximo da data de vencimento do convênio e em meio dos acontecimentos relacionados com o golpe de estado legislativo-judicial contra a Presidenta Dilma Rousseff que Cuba “continuará participando no acordo com a Organização Pan-americana da Saúde para a implementação do Programa Mais Médicos, enquanto sejam mantidas as garantias oferecidas pelas autoridades locais”, o que até o momento foi respeitado.

O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, fazendo referências diretas, depreciativas e ameaçadoras à presença de nossos médicos, declarou e reiterou que modificará termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito à Organização Pan-americana da Saúde e ao conveniado por ela com Cuba, ao pôr em dúvida a preparação de nossos médicos e condicionar sua permanência no programa a revalidação do título e como única via a contratação individual.

As mudanças anunciadas impõem condições inaceitáveis que não cumprem com as garantias acordadas desde o início do Programa, as quais foram ratificadas no ano 2016 com a renegociação do Termo de Cooperação entre a Organização Pan-americana da Saúde e o Ministério da Saúde da República de Cuba. Estas condições inadmissíveis fazem com que seja impossível manter a presença de profissionais cubanos no Programa. Por conseguinte, perante esta lamentável realidade, o Ministério da Saúde Pública de Cuba decidiu interromper sua participação no Programa Mais Médicos e foi assim que informou a Diretora da Organização Pan-americana da Saúde e os líderes políticos brasileiros que fundaram e defenderam esta iniciativa.

Não aceitamos que se ponham em dúvida a dignidade, o profissionalismo, e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio de seus familiares, prestam serviço atualmente em 67 países. Em 55 anos já foram cumpridas 600 mil missões internacionalistas em 164 nações, nas quais participaram mais de 400 mil trabalhadores da saúde, que em não poucos casos cumpriram esta honrosa missão mais de uma vez. Destacam as façanhas de luta contra o ébola na África, a cegueira na América Latina e o Caribe, a cólera no Haiti e a participação de 26 brigadas do Contingente Internacional de Médicos Especializados em Desastres e Grandes Epidemias “Henry Reeve” no Paquistão, Indonésia, México, Equador, Peru, Chile e Venezuela, entre outros países.

Na grande maioria das missões cumpridas, as despesas foram assumidas pelo governo cubano. Igualmente, em Cuba formaram-se de maneira gratuita 35 mil 613 profissionais da saúde de 138 países, como expressão de nossa vocação solidária e internacionalista.

Em todo momento aos colaborados foi-lhes conservado seu postos de trabalho e o 100 por cento de seu ordenado em Cuba, com todas as garantias de trabalho e sociais, mesmo como os restantes trabalhadores do Sistema Nacional da Saúde.

A experiência do Programa Mais Médicos para o Brasil e a participação cubana no mesmo, demonstra que sim pode ser estruturado um programa de cooperação Sul-Sul sob o auspício da Organização Pan-americana da Saúde, para impulsionar suas metas em nossa região. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Organização Mundial da Saúde qualificam-no como o principal exemplo de boas práticas em cooperação triangular e a implementação da Agenda 2030 com seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Os povos da Nossa América e os restantes do mundo bem sabem que sempre poderão contar com a vocação humanista e solidária de nossos profissionais.

O povo brasileiro, que fez com que o Programa Mais Médicos fosse uma conquista social, que desde o primeiro momento confiou nos médicos cubanos, aprecia suas virtudes e agradece o respeito, a sensibilidade e o profissionalismo com que foram atendidos, poderá compreender sobre quem cai a responsabilidade de que nossos médicos não possam continuar oferecendo sua ajuda solidária nesse país.

Havana, 14 de novembro de 2018.

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Maurilio Candido

Jornalista Profissional Mtb: 51058 - DRT/SP

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